No boletim anterior, apresentamos um panorama geral das etapas para a implantação de uma Farmácia Viva, com base na Portaria nº 886/2010 e na Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 18/2013.
Neste boletim, detalharemos algumas dessas etapas com o objetivo de orientar, de forma mais precisa, gestores, profissionais de saúde e demais envolvidos no processo. Essas etapas compreendem: definição do coordenador e do grupo de trabalho; seleção das espécies de interesse; definição das formas farmacêuticas a serem ofertadas aos usuários; verificação da infraestrutura e recursos humanos disponíveis no município; elaboração de documento detalhado sobre a infraestrutura; elaboração de projeto arquitetônico e planta baixa com layout.
Etapa 1- Definição do coordenador e do grupo de trabalho.
De acordo com a RDC 18/2013, o cargo de coordenador da Farmácia Viva deve, obrigatoriamente, ser ocupado por um farmacêutico com formação ou experiência comprovada em plantas medicinais e fitoterápicos, além de demonstrar habilidade de chefia e liderança e gestão de projetos. Caberá ao coordenador planejar as etapas de implantação e funcionamento da Farmácia Viva, executar todas as etapas referentes a sua área de atuação e monitorar o cumprimento das normas sanitárias e os resultados do serviço junto à população.
Considerando que a Farmácia Viva abrange diversas etapas da cadeia produtiva de plantas medicinais, o grupo de trabalho deve ser multidisciplinar, sendo composto por:
- Profissionais de diferentes categorias como, farmacêuticos, médicos, enfermeiros, agentes comunitários de saúde (ACS).
- Agricultores locais e/ou técnicos agrícolas com conhecimento em cultivo de plantas medicinais.
- Representantes da Gestão Municipal/Estadual de Saúde que desempenham um papel essencial na garantia do apoio político e financeiro.
- Representantes da Comunidade a fim de integrar o conhecimento local e as demandas do território ao serviço de assistência farmacêutica prestada pela Farmácia Viva.
2. Seleção das espécies de interesse.
Nesta etapa, inicialmente deverá ser definida a relação de espécies medicinais que serão ofertadas aos usuários do SUS, com base no conhecimento popular, nos dados epidemiológicos do território, considerando critérios de eficácia, segurança e relevância para as necessidades de saúde do território. Além disso, as condições de cultivo devem ser consideradas para que se tenha um manejo adequado de cada espécie medicinal selecionada.
Para a orientação da seleção das espécies medicinais, devem ser consultados documentos oficiais do Ministério da Saúde (MS) como o Formulário de Fitoterápicos da Farmacopeia Brasileira, o Mapa de Evidências Científicas em Práticas Integrativas e Complementares, as monografias das espécies de interesse do SUS, entre outras publicações relevantes do MS.
Definidas as espécies, o próximo passo é determinar a quantidade de cada uma a ser cultivada, considerando a demanda estimada e a capacidade de produção da área disponível.
Etapa 3. Definição das formas farmacêuticas a serem ofertadas aos usuários.
A definição das formas farmacêuticas a serem disponibilizadas deve ser baseada em critérios técnicos e epidemiológicos considerando as demandas terapêuticas da população atendida, a infraestrutura disponível, bem como a capacidade técnica da equipe e da estrutura da farmácia para realizar cada tipo de manipulação com segurança e qualidade. Dentre as preparações comumente usadas pelas Farmácias Vivas, destacam-se: infusões e decocções (formas tradicionais de preparo de plantas medicinais); tinturas e extratos hidroalcoólicos; xaropes; pomadas e cremes; cápsulas contendo pós vegetais ou extratos padronizados.
Etapa 4. Verificação da infraestrutura e recursos humanos disponíveis no município.
Esses espaços incluem: horto para o cultivo das plantas medicinais, almoxarifado para o armazenamento das plantas e produtos fitoterápicos, laboratório de manipulação e controle de qualidade, consultório farmacêutico ou sala de dispensação, escritório administrativo, áreas de apoio como vestiários, sanitários e depósito de material de limpeza.
Para cada um desses ambientes, deve-se elaborar uma relação detalhada dos equipamentos, utensílios e mobiliários necessários à sua instalação, garantindo o cumprimento da RDC nº 18/2013 e no caso do cultivo, as Boas Práticas de Cultivo.
A equipe da Farmácia Viva deve ser multidisciplinar e devidamente qualificada com formação técnica ou superior compatível com as suas atribuições, garantindo a condução adequada de todas as etapas, desde o cultivo até a dispensação e orientação aos usuários.
A composição mínima deve considerar as seguintes categorias profissionais: farmacêuticos, técnicos em farmácia, agrônomos ou técnicos agrícolas e pessoal de apoio administrativo, sendo imprescindível que todos estejam devidamente qualificados para o desenvolvimento das suas funções.
6. Elaboração de documento detalhado sobre a infraestrutura.
Os principais requisitos de infraestrutura para cada área da Farmácia Viva são: as dimensões, os revestimentos (piso, parede, teto), a iluminação, a ventilação; os requisitos específicos para áreas de manipulação como superfícies lisas e impermeáveis de fácil limpeza e desinfecção; o fluxo de pessoas e materiais de modo a evitar contaminação cruzada; as instalações elétricas e hidráulicas; o sistema de tratamento de resíduos; acessibilidade.
7. Elaboração de projeto arquitetônico e planta baixa com layout:
A implantação da Farmácia Viva exige a elaboração do projeto arquitetônico e a planta baixa da Farmácia Viva. Este projeto deve estar em conformidade com as normas da ANVISA, em especial com a RDC 18/2013 e com a ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) pertinentes, como a NBR 9050 (acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos). A planta baixa deve conter, de forma clara e detalhada a disposição de todos os ambientes; o layout interno com a disposição de todos os equipamentos, utensílios fixos, pia e mobiliários; o fluxo de trabalho representando visualmente as entradas e saídas de pessoal, insumos e resíduos, a separação entre áreas limpas e “sujas” e a circulação interna sem cruzamento entre fluxos incompatíveis; zonas de risco e áreas críticas; acessibilidade.
No próximo boletim, daremos continuidade ao tema, abordando as etapas finais para a efetiva implantação da Farmácia Viva.
Referências bibliográficas:
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Decreto nº 5.813, de 22 de junho de 2006. Aprova a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, [2006]. Disponível em: Política e Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos. Acesso em: 4 abr. 2025.
BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC nº 18, de 03 de abril de 2013. Dispõe sobre as Boas Práticas de Processamento e Armazenamento de Plantas Medicinais, Preparação e Dispensação de Produtos Magistrais e Oficinais de Plantas Medicinais e Fitoterápicos em Farmácias Vivas no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, n. 64, p. 47, 4 abr. 2013.
CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA. Resolução nº 477, de 28 de maio de 2008. Dispõe sobre as atribuições do farmacêutico no âmbito das plantas medicinais e fitoterápicos e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 127, 18 jun. 2008.
SECRETARIA DA SAÚDE DO ESTADO DO CEARÁ. As Farmácias Vivas no ciclo da assistência farmacêutica: histórico e evolução. Fortaleza: SESA, 2020. E-book (30 p.). Disponível em: As Farmácias Vivas no Ciclo da Assistência Farmacêutica: Histórico e Evolução | Fitoterapia Brasil. Acesso em: 4 abr. 2025.