Posicionamento sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 108/2019

A recente proposta encaminhada ao Congresso Nacional de Emenda à Constituição nº 108/2019, com substanciais modificações sobre a natureza jurídica e outros aspectos dos conselhos e ordens de profissões regulamentadas, causa, a princípio, notória preocupação ante aos dispositivos apresentados unilateralmente pelo Governo Federal, parte deles repetitivos quando da edição da Medida Provisória nº 1.549, então convertida na Lei Federal nº 9.649/981.

Naquela oportunidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou entendimento de que os conselhos profissionais ou entidades fiscalizadoras de profissões regulamentadas são autarquias “sui generis” ou distintas, declarando a inconstitucionalidade do artigo 58 (à exceção do § 3º)2 da Lei Federal nº 9.649/98, conforme o julgamento da ADIn nº 1.717-6/DF.

E dentre os fundamentos apresentados pelo intérprete maior do texto constitucional no referido julgado, destacou-se o fato de que o poder de polícia não pode ser exercido por entidades de direito privado.

O STF também já se pronunciou que as qualificações profissionais de que trata o artigo 5º, inciso XIII, da Constituição Federal, somente podem ser exigidas, pela lei, daquelas profissões que, de alguma maneira, podem trazer perigo de dano à coletividade ou prejuízos diretos a direitos de terceiros, sem culpa das vítimas, tais como as profissões ligadas à área de saúde, a engenharia, a advocacia e a magistratura, entre outras várias, cujo exercício diz diretamente a vida, a saúde, a liberdade, a honra e a segurança do cidadão (apud RE nº 511.961).

Com efeito, inserir os conselhos e ordens profissionais no patamar constitucional poderia ser um salutar reconhecimento desde que mantida a natureza jurídica de direito público, reforçando assim a importância do papel por eles desempenhado historicamente em prol da sociedade brasileira, independente da sua área de atuação.

No caso da Farmácia, milenar profissão da saúde, a atuação dos conselhos federal e regionais tem demonstrado, ao longo de 59 anos de existência, a notória preocupação em garantir direitos fundamentais do cidadão brasileiro, seja no âmbito do medicamento como nas demais áreas de atuação do farmacêutico, sempre pautando-se no princípio da supremacia do interesse público sobre o privado.

Para tanto, promove sistematicamente a fiscalização técnica e ética do exercício profissional farmacêutico, incluindo a defesa dos direitos do paciente/consumidor, exercendo o seu poder de polícia num universo composto em torno de 220.000 farmacêuticos, 88.000 farmácias/drogarias, além de laboratórios clínicos, da indústria farmacêutica e áreas afins, sendo uma função pública que visa assegurar o direito coletivo mediante uma restrição razoável do direito de exercício profissional e da atividade mercantil, vez que a própria Constituição Federal não relativiza nem abre qualquer exceção ao direito à saúde previsto em multifários dispositivos (artigos 6º, 7º, 23, II, 24, XII, 30, VII, 34, VII, “e”, 35, III, 194, 196, 197, 198, 199, 200, 208, VII, 212, § 4º, 227).

Feitas tais considerações, aguardamos a nossa oitiva para adequado debate no âmbito do renovado Congresso Nacional, fornecendo inclusive dados concretos e demonstrativos da efetiva contribuição dos conselhos de farmácia na delicada área da saúde no país.

Walter da Silva Jorge João
Presidente – CFF

 



1 Art. 58. Os serviços de fiscalização de profissões regulamentadas serão exercidos em caráter privado, por delegação do poder público, mediante autorização legislativa.


§ 3º Os empregados dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas são regidos pela legislação trabalhista, sendo vedada qualquer forma de transposição, transferência ou deslocamento para o quadro da Administração Pública direta ou indireta.

Fonte: Conselho Federal de Farmácia