De saída da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) após seis anos como diretor quase quatro deles como presidente, Dirceu Barbano, 48, avalia que "ficou ruim para o Congresso" e não para a agência a recente tentativa dos parlamentares de suspender o veto da Anvisa aos emagrecedores.
No início de setembro, o Congresso suspendeu o veto a três inibidores de apetite definido pela Anvisa em 2011. Ainda no mês passado, a agência conseguiu reverter a liberação com outras normas.
Essa experiência mais a ações da indústria tabagista contra o veto da Anvisa aos aditivos que dão sabor ao cigarro medida até agora suspensa pela Justiça geraram um "aprendizado", segundo ele. "Precisamos ter muito embasamento técnico-científico para tomar a decisão e uma leitura clara de quais são as forças que vão tensionar' contrariamente", afirmou Barbano à Folha.
Folha - O que avançou na Anvisa durante sua gestão como diretor e presidente?
Dirceu Barbano - A Anvisa, hoje, é uma instituição mais transparente e permeável à sociedade, com reuniões abertas, agenda regulatória, consultas públicas, audiência pública. A Anvisa aprendeu a ouvir mais.
A agência assumiu que tem um papel fundamental na proteção da saúde das pessoas, mas ela também é uma agência com um viés econômico muito grande. São duas agendas que conseguem ser desenvolvidas sem dilema. Tomamos medidas olhando oportunidades de incentivar indústria.
Em que não avançou? Precisamos melhorar muito a eficiência da agência em relação a prazos.
Em relação ao tabaco, a Anvisa adotou uma medida importante, o veto aos aditivos de sabor, mas essa ação está suspensa pela Justiça.
Fizemos tudo o que podíamos fazer em relação ao tabaco. Foram ações barradas não por dificuldades nossas, mas por questões externas.
É importante a agência ter em mente que ela não existe sozinha no mundo, essas outras forças estão vivas, também agem. Gera um desgosto, claro, mas é assim.
Houve também a tentativa de barrar o veto da agência sobre os inibidores de apetite. Essas situações comprometem a imagem da Anvisa? São circunstâncias diferentes. Estávamos banindo aditivos do tabaco com uma base científica bem distinta da que tínhamos para os anorexígenos o universo de dados sobre os anorexígenos é mais abundante. Então, gerou para o tabaco uma fragilidade a ser explorada.
Os dois casos tinham em comum que forças externas à Anvisa conseguiram barrar a norma, mas são duas circunstâncias que geram o aprendizado de que precisamos ter muito embasamento técnico-científico para tomar a decisão e uma leitura clara de quais são as forças que vão "tensionar" contrariamente às normas.
A melhor forma de neutralizar isso é se basear em vastos dados científicos. Ainda assim, isso não é suficiente. O caso dos anorexígenos é um exemplo. Não imaginávamos que médicos, farmácias de manipulação e outras forças agiriam nem como agiriam.
Fica uma imagem ruim para a agência pelo fato de ter uma norma suspensa? É pior para quem faz. A Anvisa, hoje, é uma agência que tem uma imagem que se equipara às agências americana, canadense, australiana, que são as maiores do mundo. Ficou ruim para o Congresso, não acho que ficou ruim para a Anvisa.
Com sua saída, a diretoria ficará sem ninguém da área da saúde. Ficam dois advogados e dois economistas, até a próxima indicação. Isso pode fragilizar as decisões? É fundamental a presença de um profissional de saúde na diretoria colegiada da Anvisa. E acredito que o governo tem sensibilidade para isso. A agência, em si, não sofre muito, porque tem um corpo técnico altamente qualificado. Mas, em determinadas decisões, é necessário que a diretoria possa questionar as verdades absolutas dos técnicos. E, nesse momento, é que imagino que os diretores fiquem um pouco fragilizados.
Fonte: Folha de S.Paulo
Autor: Johanna Nublat