Crescem denúncias de venda de antibióticos sem receita

Quatro anos depois de editada resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que proíbe a venda de antibióticos sem receita médica, aumenta o número de denúncias de venda irregular desses medicamentos ao Conselho Regional de Farmácia de Minas Gerais (CRF-MG). Desde o fim de novembro de 2011, os estabelecimentos comerciais são obrigados a reter o receituário, que passou a ter validade de apenas 10 dias a partir da data de prescrição pelo médico.

Além contrariar a resolução da Anvisa, a venda de antibióticos sem receita fere ao menos quatro artigos do Código de Defesa do Consumidor (CDC) que estabelecem o respeito à saúde e segurança das pessoas. A coordenadora do Procon de Belo Horizonte, Maria Lúcia Scarpelli, cobra mais rigor nas fiscalizações e propõe uma força-tarefa do órgão com a Vigilância Sanitária e o Conselho Regional de Farmácia para coibir o comércio ilegal de medicamentos.

“Os responsáveis pela venda irregular devem ser punidos criminalmente”, reitera Lúcia Scarpelli. Ela cita o artigo 56 do CDC que prevê desde multa à cassação de licença do estabelecimento ou da atividade. “Os casos ocorrem geralmente quando o farmacêutico não está presente na empresa e o balconista, que não tem conhecimento científico, acaba fazendo a venda com muita irresponsabilidade. Tem que haver punição”, disse.

O vice-presidente do CRF-MG, Claudiney Luís Ferreira, informou que embora acionada em razão do crescimento das denúncias nos últimos meses, a instituição só tem autonomia para fiscalizar o exercício profissional. “Quando usado sem critério, em vez de curar esse tipo de medicamento pode deixar o organismo mais resistente às bactérias”, destaca. Segundo ele, o farmacêutico que vende antibióticos descumprindo a determinação da Anvisa também está sujeito a penalidades administrativas.
“O profissional pode sofrer desde processo ético-disciplinar até cassação do registro”, afirma Claudiney Ferreira. Ele afirma, ainda, que muitas farmácias contam com estoques clandestinos, o que dificulta a fiscalização. “Temos de cobrar da Anvisa e da Vigilância Sanitária que aumentem a fiscalização e o controle da venda desses produtos. Eles podem provocar sérios danos à saúde se usados sem acompanhamento médico”, alerta. Dados da Associação Brasileira das Indústrias Farmacêuticas (Abifarma) indicam que a arriscada prática cultural da automedicação é responsável pela morte de 20 mil pessoas por ano no país.

O estudante Luís Henrique Montovanelli conta que passou a ter mais trabalho para comprar os medicamentos, mas desaprova a venda sem prescrição. “A pessoa tem que ter noção do que está tomando e o mesmo vale para remédios controlados, quando há risco de dependência química”, diz. Para a auxiliar de serviços gerais Lorena Alves, a precariedade e a demora nos atendimentos dos hospitais públicos são os principais motivos que levam pessoas a se automedicar. “Meu filho de 3 anos tem bronquite e nem sempre consigo levá-lo ao posto. Os médicos sempre receitam amoxilina, mas por falta de atendimento já consegui comprar sem prescrição médica”, afirma.

CRIME DE TRÁFICO - Procurada pelo Estado de Minas, a Vigilância Sanitária de Belo Horizonte não forneceu dados sobre vistorias e números de denúncias e nenhuma fonte foi disponibilizada para falar sobre o assunto. Já a Anvisa informou que controla a comercialização da droga, exigindo que farmácias e drogarias retenham a receita do paciente ao comprar o remédio.

Por meio de nota, a Anvisa informou que a venda irregular de medicamentos é crime e pode ser enquadrada como tráfico de drogas. No âmbito da Vigilância Sanitária, é considerada infração sanitária. As penalidades, que estão previstas na lei 6.437/77, são de notificação, interdição e multa, que pode variar de R$ 2 mil a R$ 1,5 milhão.

Prescrição indevida tem índice elevado

De um lado, o comércio ilegal de antibióticos; de outro, a falta de cautela na prescrição de antibióticos. Estudo realizado pela Associação Brasileira de Defesa do Consumidor – Proteste mostrou que metade dos 30 clínicos gerais consultados pela instituição na cidade do Rio de Janeiro receitou esse tipo de medicamento para pacientes que simularam uma dor de garganta inexistente. Uma farmácia que vendeu o medicamento sem receita foi denunciada à Vigilância Sanitária.

“Os casos foram repassados a Associação Médica Brasileira para que tome providências e desenvolva campanhas de conscientização quanto à prescrição criteriosa de antibióticos”, disse Maria Inês Dolcci, coordenadora institucional da entidade. Segundo ela, para realizar o estudo foi pedido a colaboradores saudáveis que, anonimamente, fossem aos consultórios de clínica geral e a 28 farmácias e drogarias, entre julho e agosto.

O objetivo era verificar a postura dos médicos quanto à prescrição de antibióticos e confirmar se farmácias os vendem sem receita. Foram agendadas consultas com médicos particulares. Elas duraram, em média, 15 minutos. Os valores pagos variaram de R$ 80 a R$ 400.

Maria Inês reforça a importância da participação do consumidor para combater a automedicação. “A denúncia é muito importante. Qualifica a farmácia e notifica os profissionais que prescrevem erroneamente esses tipos de medicamentos”, completa. Para denunciar a venda de antibióticos sem receita, os números são: Vigilância Sanitária de Belo Horizonte (156) ou Anvisa (0800-642 9782).

O que diz o código

Artigo 56 – As infrações das normas de defesa do consumidor ficam sujeitas, conforme o caso, às seguintes sanções administrativas, sem prejuízo das de natureza civil, penal e das definidas em normas específicas:

I - multa;
II - apreensão do produto;
III - inutilização do produto;
IV - cassação do registro do produto junto ao órgão competente;
V - proibição de fabricação do produto;
VI - suspensão de fornecimento de produtos ou serviço;
VII - suspensão temporária de atividade;
VIII - revogação de concessão ou permissão de uso;
IX - cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;
X - interdição, total ou parcial, de estabelecimento,
de obra ou de atividade;
XI - intervenção administrativa;


Fonte: Estado de Minas