Doenças como artrite reumatoide e lúpus mudam pré-natal

O lúpus eritematoso sistêmico (LES) e a artrite reumatoide (AR) escolhem sexo e faixa etária: o principal alvo são as mulheres e em idade reprodutiva. Receber o diagnóstico de uma doença crônica no auge da vida adulta, por si só, é um drama. Descobrir que, para engravidar, serão necessários cuidados extras, que a experiência pode piorar a doença, que o bebê também corre riscos e que, em casos mais graves, a gestação é contraindicada causa dor e apreensão em muitas pacientes.

Mulheres com lúpus, principalmente aquelas com acometimento renal e anticorpos antifosfolípides (responsáveis por formar coágulos que podem obstruir a passagem de sangue nas veias e artérias), têm maior risco de sofrer abortamento, alterações do crescimento do feto, parto prematuro e a chamada doença hipertensiva específica da gravidez, mais conhecida como pré-eclâmpsia. Outra complicação rara, mas possível em pacientes que engravidam é o lúpus neonatal. Ele ocorre quando alguns anticorpos da doença, especificamente o antiRo/SSA e o antiLa/SSB, atravessam a placenta e podem agredir o feto em formação, levando ao bloqueio cardíaco congênito, a lesões de pele e à redução das células sanguíneas no recém-nascido. Essa complicação ocorre, em média, em 7% de gestantes que apresentam os anticorpos.

No entanto, todas essas complicações não são contraindicações para a gravidez em mulheres com lúpus. Hoje, com maior conhecimento e melhores estratégias de acompanhamento e tratamento da enfermidade autoimune, é possível controlá-la de forma mais eficaz, fazendo com que as gestações sejam bem-sucedidas e sem complicações. “Pacientes com a doença controlada podem ser mães. O mais importante é o acompanhamento próximo do reumatologista e do obstetra, e o planejamento da gestação. Mas pacientes com lúpus mais grave, ou que já têm sequelas importantes da doença, como redução da função dos rins, não devem engravidar”, pondera o reumatologista Boris Cruz, secretário da Sociedade Mineira de Reumatologia.

O ideal é que o lúpus esteja inativo por, ao menos, 12 meses antes da concepção. As mulheres devem ser submetidas a avaliação especializada antes de decidirem sobre a gravidez, incluindo não só a história clínica, mas a pesquisa de anticorpos que podem influenciar o curso da gravidez, caso dos antifosfolípides, do antiRo/SSA e do antiLa/SSB. “Mesmo com a doença controlada, a gravidez deve ser considerada como de risco aumentado, pelo que se faz necessário acompanhamento frequente dos médicos. A monitorização adequada da mãe e do feto permite o diagnóstico precoce de eventuais complicações e há tratamentos possíveis para o lúpus durante a gravidez”, explica o médico.

Segundo a professora de reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Cristina Costa Duarte Lanna, coordenadora do Ambulatório de Lúpus Eritematoso Sistêmico do Hospital das Clínicas, os dois principais riscos para os bebês são o lúpus neonatal e as alterações do batimento cardíaco, resultado dos dois anticorpos (antiRo/SSA e antiLa/SSB) que podem passar para o bebê. No primeiro, os anticorpos são eliminados em seis meses. Já a alteração cardíaca é mais grave, apesar de rara. Trata-se de um bloqueio cardíaco que exige o uso de marcapasso. “Se for incompleto, a criança tem alguma sobrevida; se for completo, nem sempre ela sobrevive. Mas um bom pré-natal é capaz de identificar e abordar o problema antes”,diz.

Controle no pós-parto

No caso da mãe, há casos em que o tratamento precisa ser suspenso durante a gestação. Eloisa Bonfá, professora titular de reumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e diretora clínica do Hospital das Clínicas da FMUSP, explica que, na artrite reumatoide existe, em geral, uma melhora com a gravidez. O cuidado, porém, precisa se maior no pós-parto, pois pode ocorrer a reativação da doença.

Dependente de medicações complexas para manter a artrite reumatoide sob controle, Simara teve de se programar para engravidar. Parte da medicação foi suspensa com antecedência devido ao risco de malformação fetal. Ela é paciente do Sistema Único de Saúde (SUS) e fará o parto na cidade em que mora, em Itanhandu, no sul de Minas. “Foram muitas decepções antes desse momento de tanta felicidade. O médico que nos acompanha em uma doença como essa deve ser uma pessoa em quem a gente confia, sente amparo, busca todas as informações para termos uma vida mais tranquila. Ouvir dele que você não pode engravidar desmorona qualquer mulher”, conta.

Fonte: Correio Braziliense