Estudo mostra como imunidade cai com a idade

À medida que envelhecemos, nosso sistema imunológico vai perdendo a capacidade de combater novas infecções. Isso deixa os idosos mais vulneráveis a diversas doenças e faz com que, por exemplo, uma gripe comum possa evoluir para um quadro de pneumonia grave. Por trás deste processo está o encolhimento (atrofia) do timo, um pequeno órgão localizado entre o coração e o esterno (o osso achatado no meio do tórax), a partir da adolescência. Isso porque é no timo que ocorre o amadurecimento dos linfócitos T, células de defesa do organismo com um papel central no desenvolvimento do sistema imunológico adaptativo, em que o organismo reconhece novos patógenos (agentes causadores de doenças) e mantém uma “memória” que facilita o combate de infecções futuras pelo mesmo agente. Até agora, os cientistas não sabiam o que fazia o timo começar a encolher rapidamente tão cedo em nossas vidas, mas um estudo publicado esta semana no periódico científico “Cell Reports” identificou um mecanismo que pode explicar o aparente “envelhecimento precoce” do órgão. A descoberta abre caminho para o desenvolvimento de tratamentos que procurem retardar o processo e trazer melhor qualidade de vida para os idosos.

Danos devido à ação dos radicais livres

Em experimentos realizados com camundongos, pesquisadores do campus da Flórida do Instituto de Pesquisas Scripps verificaram que o timo começa a regredir devido à falta da enzima catalase. Presente em praticamente todos os tecidos do organismo ao longo de nossas vidas, a catalase é responsável por “limpar” do organismo os chamados compostos oxidantes, também conhecidos como radicais livres, que são um subproduto natural do metabolismo celular, como o peróxido de hidrogênio (H2O2), a popular água oxigenada. Sem a catalase, o timo fica mais sujeito, mais cedo, a sofrer os danos provocados pelos radicais livres, algo que, em tese, poderia ser retardado com o consumo de alimentos ricos em substâncias antioxidantes, como as vitaminas C e E, ou futuras terapias específicas.

— O timo envelhece muito mais rápido que qualquer outro tecido do corpo, diminuindo a capacidade de indivíduos mais velhos de responder a novos desafios imunológicos, inclusive patógenos que evoluem (como o vírus da gripe), e às vacinas, que poderiam proporcionar proteção contra eles — destaca Howard Petrie, principal autor do estudo. — Nós fornecemos, pela primeira vez, uma ligação mecânica entre os antioxidantes e a função imune normal, abrindo novas avenidas para potenciais estratégias de tratamento que melhorariam as defesas imunológicas de uma população em processo de envelhecimento.

Como estudos anteriores, no entanto, já haviam indicado que a ação dos hormônios sexuais, em particular a testosterona, também tem forte influência no crescimento e posterior regressão do timo, os cientistas fizeram uma série de experiências com camundongos desenhadas para verificar se a deficiência de catalase teria mesmo alguma relação com a atrofia do órgão, e se as substâncias antioxidantes poderiam ajudar a retardar ou reverter este processo. Numa delas, camundongos geneticamente modificados para produzirem a enzima continuamente no timo tinham o órgão com o dobro do tamanho de animais normais aos seis meses, ou seja, já avançados na idade adulta. Já camundongos que receberam dois compostos antioxidantes comuns (vitamina C e acetilcisteína) a partir do desmame mantiveram o tamanho do timo aos dez meses de idade, quando os animais comuns já tinham perdido 40% da massa do órgão. Diante disso, os pesquisadores consideram que o resultado apoia a tese de que o envelhecimento está ligado, pelo menos em parte, ao efeitos danosos dos radicais livres.

— No caso do timo, a atrofia é mais rápida do que em outros tecidos, o que demonstramos agora ser uma consequência da deficiência de catalase num ambiente altamente metabólico — destaca Petrie. — Nossos experimentos mostram que a atrofia tímica representa mais um exemplo do reconhecido processo de dano celular resultante da exposição ao longo da vida aos subprodutos oxidantes do metabolismo aeróbico.

Não há ‘bala de prata’

Estes achados, porém, estão longe de significar que basta consumir alimentos ricos em antioxidantes ou compostos com estas propriedades para retardar o envelhecimento, aponta o gerontólogo Otávio Nóbrega, integrante da diretoria da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) e professor da Universidade de Brasília (UnB). Segundo ele, diversos estudos que envolveram suplementação alimentar com vitaminas C e E falharam em encontrar evidências de aumento da longevidade ou de retardo no aparecimento dos sinais da idade.

— Não existe um elixir contra o envelhecimento, que é um processo multifatorial — lembra o especialista. — A ação dos radicais livres é apenas parte deste processo, mas o estudo tem o mérito de apontar a relevância dos mecanismos de proteção contra estes compostos na involução do timo. Neste sentido, ele abre uma janela para que se aprofundem as pesquisas em torno do controle dos radicais livres para retardar a perda de eficácia do sistema imunológico, o que se encaixa na nossa visão de dar à pessoa idosa mais conforto e qualidade de vida.

Fonte: O Globo